Alex: uma história de Amor

Acabo de ler um livro e desejo contá-lo: Irene M. Pepperberg é mulher forte e lutadora. Professora de cognição animal em Harvard, pertence à nobre categoria de pessoas de espírito superior. Ela narra com delicadeza e muito amor sua experiência com Alex, um papagaio cinzento africano, que foi seu companheiro por trinta anos. Apesar da formação em química, sua paixão pelos bichinhos emplumados que traz consigo desde a infância a levou para as ciências biológicas e o estudo do comportamento dos animais. Enfrentou mil preconceitos por ser mulher e mostrou de perto como é a vida acadêmica nos corredores das universidades, denunciando uma questão polêmica e um dos temas indiretos de seu livro: o preconceito no mundo científico. Muitos cientistas se recusam a aceitar a própria ciência que tanto admiram. Uns por medo de dar o braço a torcer e terem de reaprender muito do que viram no passado, já outros por pura rabugice.

Ela treinou Alex utilizando diversos métodos, e o resultado foi absolutamente maravilhoso, surpreendente e encantador, ganhando fama nos jornais e mesmo na TV americana. Certa vez, Alex derruba involuntariamente uma xícara no chão e a quebra, ao levar uma bronca da pesquisadora responde “desculpa”. Ele simplesmente se lembrou de ter visto sua tratadora brigando com alguém que a respondeu dessa forma. Como se não bastasse, Alex se mostrava uma ave inteligentíssima e apresentava resultados muitas vezes melhores do que os obtidos com primatas, aprendeu cerca de cem palavras e foi capaz de somar e entender conceitos de maior, menor, mais, menos e “nenhum” (essa parte é a cereja do bolo, leiam! Vale a pena!). Como uma criaturazinha adorável com o cérebro do tamanho de uma noz pôde fazer tanta coisa? Ao que parece, a resposta ainda é um mistério para a ciência.

Irene nos conta como uma boa amiga sua paixão pelas ciências exatas, sua entrada na universidade no início dos anos 70, seu desenvolvimento acadêmico e como conheceu seu marido. Para os leitores mais atentos, é possível encontrar trechos belíssimos descritos com muita propriedade e sensibilidade na escolha das palavras, os parágrafos são deliciosos.

Voltemos ao papagaio prodígio: ao perceber que era o mais paparicado do laboratório por ter os melhores resultados, logo passou a demonstrar indiferença e até esnobar os cientistas, respondendo errado de propósito, enganando os tratadores a fim de ganhar porções extras de milho, atrapalhando os testes dos outros cinzentos entre outras travessuras. Irene conta que Alex costumava soprar as respostas para seus colegas de gaiola, e mais do que isso, para demonstrar sua supremacia, respondia com certo tom autoritário “está errado!, Faça de novo! Não é assim.”.

Ele não estava imitando.

Alex e eu [Ed. Record, 229 pág, R$30 em média nas livrarias, na famosa Estante Virtual, encontra-se a partir de R$15) é um livro maravilhoso, página após página fui surpreendido pela capacidade fantástica desse incrível bichinho. Irene relata ainda sua dificuldade de convencer o meio científico de que uma ave conseguira resultados em testes de cognição melhores do que chimpanzés, e isso, não nos esqueçamos, com um cérebro dez vezes menor. Muitos biólogos sustentam arrogantemente que apenas os primatas conseguem aprender conceitos de números, cores entre outras coisas. Mesmo diante de números e resultados legitimamente científicos, não foi fácil conseguir um espaço, e muitos projetos de pesquisa da mais alta seriedade e importância não eram aprovados.

Quando não queria colaborar nos testes, respondia “Quero noz” e, se não fosse prontamente atendido, repetia tal qual um adulto ao repreender uma criança travessa “quero uma noz, ‘nnn’ ‘ooo’ ‘zzz’”. Quando estava cansado, não hesitava em interromper os testes e pedir “quero voltar” [para a gaiola].

Não sei se consegui transmitir aos amigos leitores paixão pelo livro. O fato é que foi sem dúvida uma das melhores leituras que já fiz. Às vezes é chata a questão da “crítica”, mas o New York Times escreveu: “Uma grande celebração, com muitas histórias que aquecem o coração”, e a Publishers Weekly “Um tributo comovente”, assino embaixo. Brindo-os com mais uma façanha de Alex para encerrar esta humilde resenha: ele foi apresentado a uma porção de chaves de variados tamanhos e cores, acompanhe:

Alex, qual cor é maior? [ele deveria dizer qual era a cor da chave maior]

Quero noz!

Depois! Agora responda: qual cor é maior?

Quero nnnooozzz!

Você terá sua noz, qual cor é maior?

[Silêncio]

Alex, qual cor é maior?

Verde... [resposta incorreta e dada com indiferença]

Não, Alex. Qual cor é maior?

Branco [novamente incorreto, também com desdém]

Seu chato! O que você quer com isso?

Quero voltar.

Quando Irene sai da sala irritada, Alex brada a plenos pulmões:

Azul! Azul! Desculpe! Volta aqui! Azul! [a resposta estava correta]

Dá para creditar numa coisa dessas? Irene prova magistralmente que sim.
Comprei para mim, mas gostei tanto que vou presentear uma amiga bióloga. Leia, encante-se, emocione-se.


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O Homem continua a ser a criatura mais egoísta do reino animal ao negar inteligência a outras espécies, como se fossem “eles próprios” os criadores de tudo que aí está. Às vezes me vejo perdido em sonhos de criança como falar com animais. Seria tão bonito. Seríamos carnívoros? Como convencer um animal de que ele deveria ser morto para nos servir de alimento? Amo a minha cocker de 4 aninhos, e muitas vezes sua inteligência espanta. Ainda que esteja cochilando, minha irmã cochicha em seu ouvido “Poli, o pombo está comendo a sua comida” imediatamente ela desperta e sai em disparada rumo ao quintal olhar para cima e latir furiosamente em busca de uma “revanche”.

Tinha apenas 16 anos mas ainda me lembro. Havia um cachorro vira-latas na minha rua que fora bastante castigado e maltratado pela vida. Escapou com uma perna quebrada de um atropelamento e nunca recebeu qualquer tratamento. Meu pai também tentou matá-lo a vassouradas após ter avançado e furado o saquinho de leite que ele trazia para casa mas o pobre cãozinho também se salvou, em parte porque, apesar de manco, não bebia e seus reflexos, ao contrário dos do meu pai, ainda eram bastante ágeis. Meus gritos desesperados de “para pai! Deixa ele!” também ajudaram. Voltando da escola, via o animal muitas vezes na porta dos botecos do bairro esperando aflito que lhe jogassem alguma coisa. Seu olhar era comovente. Depois de algum tempo, ficou cego de um olho. Fico emocionado ao lembrar de uma vizinha que se dispôs a cuidar dele. Passou a dar-lhe ração, água e, nas noites mais frias ou chuvosas, abrigo. Ocorre que essa boa mulher saía de casa por volta de seis da manhã e só voltava tarde da noite, mas não tinha problema, seu fiel amiguinho a esperava com paciência.

A boa samaritana se chamava Elaine e tinha um Fiat Uno vinho. O vizinho da frente também tinha um carro igualzinho ao dela. O cachorro apenas descansava no canto da calçada até ouvir de longe o carro se aproximando, ele parava a uma distância de cerca de trinta metros do animal, a porta se abria devagar... ao ver a perna do homem, o cão voltava a dormir, mas quando via uma perna feminina, apesar da distância e de já estar cego, seu coraçãozinho canino não podia conter tamanha emoção e passava a latir vivamente numa explosão de alegria e a abanar o rabo festivamente enquanto corria em sua direção.

Que ternura!

Não demorou muito para que ele aprendesse a distinguir o barulho do carro dela. Diversas vezes fiquei acordado olhando pela janela a hora em que chegavam. O carro do homem passava, e o cão permanecia hibernado. Bastava um pequeno ruído diferente para fazê-lo levantar a cabeça e as orelhas em alerta máximo, era o carro de Elaine.

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